28.4.06

meu calhambeque, bip-bip

postar às 9h da manhã é mesmo um luxo. mas não tem a poesia da noite, claro.
li esses dias um texto da martha medeiros sobre uma mulher que procura um lugar para chorar, dentro de seu carro e não encontra onde possa estacionar. aí chora com o carro andando mesmo. dizer que o texto está bem escrito é redundância. a martha (desculpe a intimidade) é hoje minha escritora favorita. ela fala do cotidiano, nos põe pra pensar a vida em curso. nos retrata, nus e fáceis como crianças.
isso de chorar no carro é um hábito antigo meu, principalmente depois que me casei. e mais ainda depois que tive minha filha. saio pelas ruas pouco movimentadas, andando a vinte por hora, deixando vazar aquelas mágoas pequenas ou grandes que ficam pingando por dentro e terminam por sufocar. aí libero o dilúvio e a sensação de alívio é avassaladoramente boa. é uma euforia pós-parto. pra mim, que tenho tanta dificuldade de demonstrar o que sinto, são momentos preciosos. dentro do carro choro alto e soluçado, dolorida e piegasmente. tenho uma amiga que também usa este veículo (trocadalhinho...).
por isso quando passar por um carro onde uma mulher se acaba de chorar, faça cara de parede e finja que o quadro faz parte da paisagem. e, na verdade, faz. dessa paisagem onde mulheres que choram não recebem promoção (é emocionalemnte instável), geram culpa na família (olha o que você fez com a sua mãe!) ou passam por frágeis (tadinha dela, não agüenta pressão...).
se você nunca chorou no carro, experimente. e experimente também ler martha medeiros. assim até dá pra ser feliz.

25.4.06

deixai vir a mim as criancinhas. mas não agora.

em frente à mesa onde escrevo agora, pregado na parede, tem um desenho da minha filha - um que ela fez pra mim. o desenho mostra nós duas de costas para quem olha o desenho e de frente para um parque de diversões. ela aponta para uma roda-gigante e eu para uma montanha-russa. eu não levei minha filha a este parque. eu também não a levei a pelo menos 5 filmes que ela quis ver nos últimos meses. nem brinco com ela tantas vezes quantas ela pede.
fico pensando que máscaras ela construirá para se defender dos meus nãos. de que material serão feitas, para que ela enfrente os outros nãos que enfrentará pela vida. que resistência oferecerão às muitas frustrações. e quanta infelicidade também encobrirão.
um dia ela vai descobrir que muitos dos seus sorrisos, que grande parte da sua postura, que essa ou aquela indiferença não são realmente suas. são máscaras, defesas. mentiras inúteis. sei que as coisas não deviam ser assim, mas também sei que isso é usual. todos tentamos nos defender da dor desde muito cedo. alguns de dores profundas, causadas por pancadas pesadas. alguns de dores banais. mas não sei se para a criança existe diferença entre elas. chora menos a criança que não foi ao parque do que a que apanha de um pai? no mundinho delas, as dores se diferenciam? claro que não falo da dor causada pela loucura de muitos adultos, de suas paranóias e demônios, mas dessas cotidianas e comezinhas. qual é o tamanho da tragédia infantil?
tenho trabalhado - ou tentado trabalhar - com minha criança interior. ela tem uma dor tão grande que eu ainda não ousei encarar. no entanto, não tenho lembrança alguma de um fato especialemtne trágico ou doloroso na minha infância. talvez tenha tomado alguma sombra por fantasma, não sei.
e assim oscilo entre a criança que tenho dentro de mim e a que crio. ambas precisam do meu equilíbrio, da minha maturidade. e tudo que eu tenho feito é dizer não. a ambas.
de novo: culpa, culpa, mea maxima culpa.

24.4.06

pouca pompa e muita circunstância

hoje fiz 12 anos de casada. tanta coisa.

pelo ouvido

fiquei sem internet outra vez. tá parecendo piada, já. uma empresa, não sei se a br telecom, teve que fazer um reparo numa central telefônica aqui perto e ligou outra linha telefônica ao meu telefone. e com a minha linha, sei lá o que aconteceu. fiquei o feriado todo sem internet e sem telefone. pode? sai, ignorância, desse país que não te pertence!!!!
enfim...
estou lendo um livro que recomendo a quem interessar possa: a fórmula da felicidade, de stefen klein, ed. sextante. não é auto-ajuda, não. é coisa séria. fala sobre como nosso cérebro aprende as coisas. e que é possível aprender a ter uma postura mais tranquila na vida. assim, ó: se vc dá muita moral pra dor, seu cérebro aprende cada vez mais a sentir dor. se vc trabalha no sentido de dar mais valor às coisas boas e prazerosas, seu cérebro vai perceber mais as coisas boas e prazerosas. (eta resuminho bão!). é por aí... vale a pena.


quando ele não me ouviu

ele me vestiu com as palavras que eu não disse.
pesadas, negras, repressoras como um burca
elas me cobriram da cabeça aos pés.
não havia ar, não havia pele.
apenas as palavras não ditas cobrindo tudo de decepção.
não chorei.
apenas recolhi-me ao serralho,
junto com as outras mulheres
a quem a estupidez condenou ao silêncio.
não desisti.
o tempo contornou meu olhos como o kajal.
e até mesmo o tecido grosso da ignorância
se desfaz ao vento.
e ao tempo marcado no meu olhar.