14.1.06

...

eu fico procurando em filmes, músicas e textos, profundidades, entrelinhas. nem todos têm. nem todos têm que ter. eu é que procuro respostas como quem garimpa ouro, como quem escava minas à procura de diamantes. eu é que não respiro direito o ar e o sol apenas porque não sei as minhas respostas...
nenhum avião vai surgir no céu e escrever à fumaça: assim é...
nenhuma estrela cadente vai deixar como rastro luminoso o alívio de um porque.
o que espero está onde não alcanço, ainda que me retorça, ainda que me estique, ainda que me embole e soluce. está dentro e fundo.
preciso parar – 5 minutos, 5 dias, todo um ano – para visitar lugares em que não fui.
mas parar já é uma resposta. outra que não posso me dar agora.
estou cansada: há tantas imposições.
sou peixe, meu mar é a liberdade e continuo nadando em círculos no aquário.

One art

Elizabeth Bishop

"The art of losing isn't hard to master;
so many things seem filled with the intent
to be lost that their loss is no disaster.

Lose something every day. Accept the fluster
of lost door keys, the hour badly spent.
The art of losing isn't hard to master.

Then practice losing farther, losing faster:
places, and names, and where it was you meant
to travel. None of these will bring disaster.

I lost my mother's watch. And look! my last, or
next-to-last, of three loved houses went.
The art of losing isn't hard to master.

I lost two cities, lovely ones. And, vaster, s
ome realms I owned, two rivers, a continent.
I miss them, but it wasn't a disaster.

--Even losing you (the joking voice, a gesture
I love) I shan't have lied. It's evident
the art of losing's not too hard to master
though it may look like (Write it!) like disaster."

13.1.06

parênteses

ando precisando de um pouquinho de abraço
que é pra apagar o traço
dessa mão em vão no ar
(solidão)
ando procurando só um pouquinho de carinho
que é pra me sentir no ninho
pra não me sentir sozinho sem lar
(solidão)
ando me escondendo
e me achando nesse espelho
que é velho mas tão belo
(meu coração)
ando me espalhando
me aprendendo e me amando
apesar de ser tão falha
tão amarga e tão clara
(minha escuridão)

ando em gerúndio
tão sincero e tão profundo
movimento modernista do meu eu
não me encosto em particípio
porque parto do princípio de que o amanhã ainda é meu.

ando
e é o que importa
sou passarela, não sou porta
estrada longa e torta
ando, não estou morta.
e fim.

12.1.06

diálogo

deixa, sussurra o desejo.
não posso, reage a razão.
se solta, propõe o desejo
me perco, foge a razão.
te acho, insiste o desejo.
e se não?, sorri a razão
enlouqueço, enrouquece o desejo.
então vem, suspira a razão.
eu te amo, entrega o desejo.
talvez sim, entristece a razão
- talvez não.
eu não minto, endurece o desejo.
mente sim, brinca a razão.
só um pouquinho, admite o desejo.
não me importa, murmura a razão

utilidade pública

alguns vários amigos-irmãos-camaradas têm escrito pro meu e-mail dizendo que vieram ao blog, acharam legal, coisa e tal. mas que não sabem como mexer aqui. bom, então, em causa própria, mais do que pública, dou as dicas: você lê o post (a mensagem) do dia. aí logo abaixo da mensagem tá escrito comments. você clica e aparece um espaço pra você deixar seu comentário, mensagem etc. você coloca seu nome ou qualquer coisa que quiser (mas, por favor, que me permita identificá-lo). e clica em publicar. pronto. você pode fazer a mesma coisa em posts de outros dias. na lateral direita do blog tem o título de outros posts (previous posts) e aquelas datas abaixo (archives) enviam você pra posts mais antigos. também na lateral estão os links, que mandam você para outros blogs, de amigos meus ou apenas blogs de que gosto, mesmo que não conheça quem bloga. é isso. não tem segredo. pode mexer à vontade, você não vai detonar meu blog. se alguém ler esse post e quiser acrescentar informações para os neófitos, fique à vontade.pra falar a verdade, até outro dia eu era só visita no blog dos outros. ainda estou aprendendo a lidar com o meu. mas a todos eu peço: vez em quando, deixe um recadinho de que esteve aqui. afinal, publicar um blog é também compartilhar . e compartilhar com ninguém é meio chato.

11.1.06

amigos

amigos.
são belos e quentes,
maçãs do pecado,
hóstias da redenção.
são portos, navios,
estradas, pavios
explosão.
amigos fazem a diferença
e a igualdade,
nos colocam frente a frente
com nossa insanidade.
torquês, alicate,
faca, enxada, formão.
a mão que esculpe,
a boca que cala,
amigo, irmão

10.1.06

é amiga das horas, prima-irmã do tempo

muita gente acha que solidão é tristeza, abandono, sofrimento. nem sempre. às vezes, é agradável, acolhedora, repousante. o ruim e o bom quem determina somos nós, nossas expectativas. e nossas escolhas, claro. para mim, o sofrimento vem quando não se pode optar. quando, apesar de desejar muito alguém com quem conversar, compartilhar, não temos ninguém. não é a solidão que dói. é o desejo de não estar só.


então.

então,
solidão é assim...
um ano novo que começa entre fogos e abraços
então,
se sentir inteiro começa assim
uma certa tristeza e ao mesmo tempo uma inteireza,
uma certeza de que sempre foi assim.
no ano novo que vem
já seremos velhas conhecidas
eu e essa solidão.
nos faremos companhia,
comeremos juntas cada porção da ceia,
nos abraçaremos e a todos
desejaremos um feliz ano novo.
e o ano novo será feliz de novo
porque entre eu e minha solidão
não haverá mais estranhamento.

9.1.06

para todo mal a cura

tenho uma pessoa-irmã-amiga que teve câncer. operou e tirou o dito cujo. agora está em tratamento. é um mulherão, ossos largos, magra, olhos verdes e o nariz mais perfeito que eu já vi. por dentro é ainda mais linda. luminosa mesmo. mas é também firme e briga que é uma beleza. eu nunca vi alguém tão brava e tão doce. ela já levou muita pancada da vida. não parece. absorve cada golpe. tece em torno dele um casulo de seda. até o dia em que eles vira borboleta e se vai...
mas, em algum momento, a metamorfose não se deu. alguns casulos endureceram. e contaminaram células com essa surda revolta interna. um motim. viraram tumores, bravios, corrosivos. foram detectados a tempo e extirpados . hoje, a minha querida caminha para a cura definitiva. não tenho dúvida disso. naquele meu olimpo, ela acupa um lugar especial. é minha deusa da resiliência – um termo bem moderninho pruma antiga qualidade humana. e que ela tem de sobra, inclusive pra me ensinar.

(fiz um verso pra você,
mas era pequeno demais
pra tanto amor.
desisti.)

do baú

esse fim de semana dei uma olhada no baú. tinha uns textos de que ainda gosto. vou postar alguns. pode parecer coisa de preguiçoso, mas não é não. eles continuam valendo. nesse mundo interior paralelo, o tempo não corre. passeia entre as flores, colhendo frutas silvestres, conversando com abelhas e andarilhos. ou arrastando correntes por corredores infindáveis. uh-uhhhhh-uh!
esse aqui é uma amostra. inclui o ps. foi assim que me senti sobre o texto na época. hoje, não penso mais assim. na verdade é quase recente, data de meses. foi assim que saí de um emprego estável (?), bem remunerado, para ficar em casa fazendo outras coisas. um dia conto essa história.


a decisão mais difícil foi deixar pra trás meu porto seguro, meu casco de tartaruga, meu abrigo.
não me arrependo, embora às vezes me arrebente de preocupação. Se o preço foi caro, o produto vale a pena: meu tempo. Menos dinheiro, menos “vantagens”, mais vontades...
Repito: valeu a pena.
Já pensei se foi fuga, se era enganação, medo... Foi escolha, agora eu sei. Minha tranqüilidade é a testemunha de defesa e a consciência não me acusa mais.
Estou aprendendo novos fazeres, talvez mais simples e braçais, mas há tanto tempo ignorados e necessários...
volto ao tempo, sobre meus passos – passos que me recusei por toda a vida.
atrás de mim, gerações de mulheres me auxiliam. As mulheres fortes de minha família, todas rápidas em silêncios, serviços e respostas. Mulheres dominadoras, autoritárias doces...
Mulheres cozidas em fogão de lenha, sentimentos apurados nos tachos de cobre, ressentimentos e orgulhos passados a ferro em brasa...
Ancestrais, índias, caboclas, madames...
Na panela, água a ferver no fogo, para enganar as visitas da fome que lhes queimava o estômago. Mulheres que suportaram dores físicas, morais, angústias de paixões fortes quase nunca à altura correspondidas. mas quem haveria de conseguir? No meu sangue suas células me contaminam com um feminismo arcaico, que vê a injustiça enquanto esfrega o chão sujo das botas dos machos.
Donas que não se dobravam nem ao chicote, nem às traições. Que não reclamavam senão a ouvidos parentes. Que sofreram a solidão profunda dos orgulhosos. Mas que criaram filhos, netos, sobrinhos com amor sem peias. Talvez não houvesse carinho nas mãos dessas mulheres, mas o seu amor se derramava nas panelas cheias, nas mesas fartas, nas roupas limpas, no vai-e-vem das máquinas de costura e das facas a descascar laranjas incontáveis.
Dessas mulheres tenho exemplos e retratos. Tenho olhares marcados nas fotos e entrevistos nas faces das que me rodeiam.
Terei também eu esse olhar?
Busco agora sua ajuda, enquanto ensabôo um prato ou aprendo a lavar roupa; enquanto puxo com o rodo a água do quintal, enquanto faço prato e carinhos para minha filha, a próxima dessas mulheres, eu acho.
Então não me arrependo de ter saído de lá e vindo para cá, aqui onde elas me acolhem e me ensinam que a magia é feminina e singular.

(esse texto mistura idéias. é exagerado, canastrão, e precisa ser refeito)