24.2.11

prece madura

pai, agora que não estou mais no tempo de alimentar ilusões,
aguça meus sentidos para que eu perceba a beleza das realidades.


pai, agora que as opções foram feitas e tantas portas se
fecharam no definitivo, dá-me aceitação para que as renúncias não
sejam um fardo pesado demais.


pai, agora que a soma dos erros derrubou as jovens ilusões
de onipotência, não me tire as pretensões de continuar tentando
acertar.


pai,  agora que tantos desenganos, tantas incompreensões
repetiram lições de ceticismo, conserva minha boa fé e minha
disponibilidade frente às criaturas.


pai,  agora que as forças do meu corpo começaram a falhar,
alerta o meu espírito; livra-me do comodismo, redobra minha vontade.


pai, agora que já aprendi a precariedade de todas as coisas,
as limitações de todas as lutas, as proporções de nossa pequenez,
afasta-me do desânimo.


pai,  agora que já alcancei o ponto de perspectiva que me exalta a
visão do pouco que sei, livra-me da defesa fácil de colocar viseiras
e ajuda-me a envelhecer com a abertura dos corajosos,
dos que suportam provações até a hora da morte.


pai,  agora que aumenta o círculo das criaturas que me olham
e esperam alguma coisa de mim, dá-me um pouco de sabedoria,
ensina-me a palavra certa, inspira-me o gesto exato,
norteia minha atitude.


pai,  agora que perdi a abençoada cegueira da juventude
e só amar de olhos abertos, redobra minha compreensão,
ajuda-me a superar as mágoas, protege-me da amargura.


deus pai, , concede-me a graça de não cair na desilusão, de não
chorar o passado, de continuar disponível, de não perder o ânimo,
de não envelhecer jovem, de chegar à morte com reservas de amor.


(autoria desconhecida)

há tempos, uma querida me enviou esta prece. achei linda na época. mas agora faz  mais sentido. o fruto só cai quando maduro, não é?