28.3.09

coisas que a gente faz

existe um peso que a gente não conta
só levanta a cabeça bem alto
e continua andando
sem se curvar.

a gente aguenta e pisa firme
mantém a face serena
e as mãos bem fechadas
pra nada deixar escapar.

o medo a gente disfarça em música,
a fome a gente mata no trabalho,
e a ânsia a gente guarda pra depois -
quando fechar a porta, apagar a luz
e tampar a cabeça
com o cobertor da escuridão.

23.3.09

um dia ainda vou ser santa.

o caminho do meio... ora o caminho do meio. ele não passa lá nem cá. contempla-se de longe o rio e a floresta, sem o frescor da água, nem o alívio da sombra. o caminho do meio é para os santos, os que já não desejam. e eu só quero tudo. muito. intenso, imenso e imersa. quero todos os sentidos em alta, troco a latencia pela ardencia e a beatitude pela completude. um dia, talvez eu atinja o equilíbrio. no momento, minha única segurança é a corda que mal me sustenta. e ainda assim acredito: no lugar da queda, voo.

22.3.09

história

eu não tinha idéia da minha arrogância. tampouco da profundidade de minha ignorância a respeito dos meus próprios sentimentos. assim me envolvi na alegre inconseqüência dos que pouco sabem, e pulam e saltam poças como se nada lhes fora ser cobrado um dia. confundi leveza com o que era insapiência, despojamento com o que era uma absurda fuga dos meus princípios. tudo chega a seu termo e lá habitam os resultados. num segundo desci da torre ao calabouço. e, por vezes, no silêncio que se segue à tempestade, ainda ouço o som de um grito que mal reconheço meu . o tombo foi perfeito em trajetória e altura. ilusões quebradas, véus rasgados... e um frio endurecendo as emoções. mas como nada é sem remédio, dei a mão à criança que, devagar, me levou acima, degrau a degrau. longa a subida, profundo o desapontamento. saí. ando ainda um pouco trôpega, já que a falta da ilusão me faz perder às vezes o rumo certo. a luz da consciência me ofusca, sem a doce proteção de maya. mas caminho e sei para onde vou. paro de tempos em tempos para reorganizar os planos, agora bem mais simples. confesso trazer ainda na mochila algumas lembranças. tenho esperança de que, em algum ponto da estrada, terei a coragem de enterrá-las. talvez não. não fará tanto mal levá-las até um pouco mais além. nesse momento a criança me chama. coloco-a em meu colo, a pequena cabeça acomodada na curva do meu pescoço. isso também é felicidade.