"Serei sempre, sob o grande pálio azul do céu mudo, pajem num rito incompreendido, vestido de vida para cumpri-lo, e executando, sem saber porquê, gestos e passos, posições e maneiras, até que a festa acabe, ou o meu papel nela, e eu possa ir comer coisas de gala nas grande barracas que estão, dizem, lá em baixo ao fundo do jardim."
(fernando pessoa, livro do desassossego, 166)
assim eu achava que seria minha vida. assim eu a rejeitava. quis não mais ser "em verso ou prosa, empregado de carteira" . quis ser mais que gato ou herói. ou antes: quis ser diferente. ainda quero. quero uma vida de verdade, em que eu saiba se é dia ou noite, se tenho fome ou sono. em que não confunda a dor da angústia com a de um infarto. em que eu saiba a diferença entre corpo e sentimentos, e possa sentir um e aceitar o outro. em que não ande sempre no piloto automático. uma vida em que o domingo seja meu e não uma disputa entre faustão e gugu. em que não esqueça o que é inesquecível.
não quero nada que outros tantos não queiram.
quero um querer comum, um sorvo de ar, uma gota de chuva, um riso.
quero ser o que não ouso ainda porque me desconheço. mas que tenho sido, ocultamente, através dos tempos.
estou em gestação. no escuro do meu próprio desassossego, nem imagino o que seja a luz. flutuo no líquido morno e nutritivo de tantas interrogações. e espero, mãe e feto, parteira e dor, tesoura e amanhã.
"Se as coisas são inatingíveis... ora! / Não é motivo para não querê-las... / Que tristes os caminhos se não fora / A mágica presença das estrelas!"
(mario quintana - espelho mágico)
2 comentários:
Que texto lindo...e que lindo momento. Algo deve nascer dessa inquietude silente. Bjo.
desde que não seja um allien... rsrsrs...obrigada, atena. o moemnto é difícil. mas é assim que crescemos, né?
bj-bj.
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